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23 outubro, 2007

Terapia

Uma loucura ao amanhecer em terras de ninguém,
despertada pelo calor abrasador de uma manhã iluminada;
um sono velado a silêncio paciente
que esperava o escape, em forma de cabo electrificado;
a despedida, vazia, sem festa ou drama
encerrava um misto de alivio e noite passada.
E as palavras escritas, que numa leitura inocente,
geraram respostas pensadas mas pouco conscientes,
transformaram a prudência dum chá ao entardecer no parque infantil,
numa noite de risadas e conversa terminada de madrugada
com o prazer dum beijo, inesquecível, que quis eterno.

11 outubro, 2007

Café curto e amargo, por favor (e saiu longo e doce)
História do dia de Uma qualquer vida (expulsa de Marte)

A hora de saída foi invulgar, ainda não tinham tocado as 7 badaladas ao entardecer; o pretexto: o levantamento de um carro que me custou telefonemas sem conta, o praticar de um português refinado em reclamação escrita e um misto de irritação e conformismo que não me reconhecia; a boleia foi do braço direito, que parece ir soltando um humor negro e cúmplice com o passar do tempo; e após assinatura de contrato, depósito de caução e verificação do estado do veículo, simultaneamente com o atendimento a um potencial cliente, na minha nova função de vendedora imobiliária em part-time, lá segui caminho, convicta que chegaria atempadamente à inauguração marcada da almejada máquina de café, no sitio do costume.
A paragem era obrigatória para atestar o depósito de diesel que certamente se esvaziará antes do retorno, e como o combustível mais barato da região tem anexado um multifunções com lojas, hipermercado e parqueamento gratuito, que menos que aproveitar para ver como andavam as modas e quem sabe comprar aquele presente de aniversário, que deveria ter sido entregue há não menos de uma semana. Depois de hora e meia de passeio, que por pouco que haja para ver sempre se encontra forma de torturar os pés, encaixados em saltos altos, bonitos e elegantes mas nada práticos para palmilhar quilómetros, segui caminho com a bagageira composta não de prendas de aniversário, mas de adereços para uma sala nova, cheia de antigos pedaços de uma qualquer vida.
No limite da hora – o atraso biológico, é cada vez mais, uma teoria científica pronta a ser provada – subi pressurosamente os sacos das compras para casa, arrumei o que havia para arrumar, troquei calças e sapatos e preparei-me para desprover-me de mala levando apenas: chaves, tabaco, telemóvel e carteira. E com chaves, tabaco e telemóvel em mão, comecei a procurar desesperadamente a carteira negra que carece de qualquer vínculo afectivo, mas da qual começava a sentir saudades apenas explicáveis pelo desaparecimento do todo o seu conteúdo. Esvaziei a mala, procurei em todas as assoalhadas, relembrei que a tinha utilizado para pagar uma portagem dez minutos antes e desci na esperança de encontra-la prostrada no chão do provisório automóvel. Não encontrei. Vendo os minutos passar, subi novamente os três lanços de escadas que me levavam a um lar (demasiado) vazio e recorri novamente habitação por habitação rebuscando nos sítios mais improváveis, não havia vestígios dela. Resignada e atrasada prossegui o caminho que me levaria a tomar um café forte e saboroso, sempre acompanhado por uma conversa amigável, indispensável a um bom viver.
Não pude confirmar se tinham efectuado alguma utilização do maldito cartão de crédito, mas por qualquer estranho motivo e apesar de tudo, decidi não cancela-lo. Descansei no sofá desconsolada com um azar de culpa própria, tentando entender o que tinha acontecido e culpando o maldito sistema de encerramento de portas do carro, vestida e na esperança de acordar de um mau sonho tendo como companhia a desaparecida bilheteira. Acordei sozinha e gelada.
Sem muito mais a fazer, além de ir verificando a actualização de movimentos a crédito e formalizar o desaparecimento de todos os documentos que me reconhecem como cidadã, segui a rotina habitual e rumei ao trabalho, após recolher as moedas que sempre disperso pelos mais diversos locais da casa para poder pagar a portagem. Rapidamente esqueci o propósito de telefonar para as autoridades a fim de obter as informações necessárias e questioná-los quanto ao aparecimento do espécimen de cor preta que misteriosamente tinha resolvido deixar a minha vida. Voltara à minha rotina num ápice, tudo questão de colocar o pé no asfalto da empresa. E entre a constatação de tempos perdidos e telefonemas em alta voz a tentar entender o inexplicável, o telemóvel toca. Número identificado mas desconhecido, a vendedora imobiliária veste a pele.
- Com quem estou a falar? - perguntam do outro lado;
- Com Uma vida qualquer – respondi prontamente sem a arrogância de quem assume, que o direito a saber com quem se fala é de quem atende e não de quem chama;
- Encontrei uma carteira que penso que é sua …
Caída junto ao amaldiçoado automóvel, vítima de correrias inúteis, foi gentilmente recolhida por um bom homem, capaz de se preocupar em encontrar o proprietário, explicar-lhe onde a encontrou e ainda referir-lhe o conteúdo da mesma.
Há dias de sorte e há vidas com sorte.

01 outubro, 2007

Renacer

Semana vivida día tras día, sol nace sol se pone, parece una eternidad condensada en un instante. Nunca me acostumbraré a ese silencio crudo que se irgue como un muro, cuando tus lágrimas caen por esas rosadas mejillas, y recuerdo tu sonrisa y esas ganas de vivir que parecen adormecidas por un invierno frío y lento. No termina el camino de piedras que te deja sus marcas clavadas en alma.
Renacerás.