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05 outubro, 2006

Seria perfeito

Não entendo muito bem esse instinto maternal que as mulheres nutrem pelos maridos, companheiros, namorados ou como se quiser chamar, ao tipo com quem compartem cama e casa. Mas gostava de ter um assim ao meu lado – assim com esse instinto maternal, entenda-se –, que me lembrasse que tenho consulta marcada no dentista, que deveria ir ver porquê o meu joelho direito está sempre inchado, que seria conveniente que fechasse as portas do roupeiro, que para ter a casa arrumada ajudaria que não largasse em qualquer sítio a roupa, que me levasse os fatos à lavandaria e tivesse o jantar preparado à minha indecente hora de chegada, que desabrochasse um orgulho bonito ao dizer: “mas ela ajuda-me, a minha Uma vida qualquer, lava a loiça e arruma a mesa quando acabamos de jantar, e nalguns fins-de-semana, até põe a casa de banho a brilhar!”.
Não entendo muito bem essa dificuldade que os homens têm em ser amigos das mulheres, companheiras, namoradas ou como se quiser chamar, à tipa com quem compartem cama e casa. E não gostaria de ter um assim ao meu lado, porque conforme um leito se põe por meio de uma relação – e não propriamente para fazer uma siesta, que é a sua segunda melhor utilidade – um qualquer bloqueio atinge os cérebros masculinos, e a utilização do órgão expositor da sua virilidade parece incompatível com a da sua tão apreciada amizade. Logo vão aparecendo: esses eternos e incómodos silêncios, que antes eram preenchidos por longas e reconfortantes conversas sobre tudo e sobre nada; as reclamações dos defeitos que sempre existiram, mas que outrora eram vistos como simples apanágios da personalidade feminina e essa capacidade inigualável de tentar ajustar as formas para não ferir a amiga insubstituível, desaparece velozmente atrás de uma qualquer loira bebível ou de algum rabo de saias.
Não entendo muito bem essa dificuldade que as relações têm em manter a chama acesa, a paixão, a surpresa, no fundo, aquilo que toda a gente se queixa, desaparece com o passar dos dias, com o avançar do tempo. Necessito que alguém me explique, porquê se deixa a rotina tomar conta da vida, os hábitos da rotina e nós dos hábitos e assim terminamos encadeados aos hábitos da rotina da nossa vida. Necessito que me respondam se com o passar do tempo a luz do sol será opaca, se a escada da lua será rolante e deixará de funcionar, se o vento não voltará a soprar. Porque deveria ser proibido viver assim, sem vontade de sorrir.

8 Comments:

Blogger Cravo a Canela retalha...

Bom, fartei-me de escrever e apagar. Isso dá pano para mangas... Voltarei ao assunto em breve...

PS: uma breve reflexão - será que as relações têm prazo de validade como os iogurtes?

06 outubro, 2006 12:37  
Blogger Ana retalha...

Não, minha querida, não é o tempo, somos nós.
Como muito bem dizes, as coisas só acontecem porque as deixamos acontecer, de forma mais ou menos consciente.
Falo-te com o background que conheces e posso dizer-te que só deixamos de manter o fogo aceso quando quisermos. Não há desculpas para isso. Nem a casa, nem os filhos, nem o trabalho... se se quiser, sempre se arranjam momentos a dois, momentos para namorar e voltar a estar sozinhos no mundo.
O problema é quando essa vontade desaparece. Proquê? Não sei, até hoje ainda não percebi o que incentiva esse fenómeno, mas eu já senti os efeitos dessa mudança de vontade uma vez... e aí, sim, instala-se uma rotina que se torna insuportável, porque passa a ser a única experiência que se vive a dois: casa, filhos, limpezas, contas, roupas, etc.
Mas não são as coisas que provocam os problemas, são os problemas que fazem com que essas coisas ganhem toda uma nova importância e protagonismo, que não lhes devia pertencer.
Quanto aos namorados/maridos/companheiros-filhos, também tens toda a razão: são as mulheres-mães que os fazem assim e basta deixar de assumir esse papel de uma forma tão peremptória para as coisas voltarem ao lugar e o namorado/marido/companheiro voltar a ser namorado/marido/companheiro e não filho...
Besos

06 outubro, 2006 13:17  
Blogger zmsantos retalha...

A Ana disse tudo, e bem dito!
Só queria acrescentar que a individualidade de cada um, numa relação familiar terá de ser preservada para continuar geradora de interesses comuns á família.

Quando deixas de te sentir, deixas de sentir os outros.

06 outubro, 2006 14:17  
Blogger Uma vida qualquer retalha...

"...Necessito que me respondam se com o passar do tempo a luz do sol será opaca, se a escada da lua será rolante e deixará de funcionar, se o vento não voltará o soprar...", pura retórica. Apesar de uma autêntica ignorante na materia, não me convencem que o passar das horas tenha responsabilidade no assunto. Portanto Charraz, não te preocupes que não precisas de virar às relações de pernas para o ar procurando a tal data.

06 outubro, 2006 14:58  
Blogger Ana retalha...

Lindinha, o que se defendeu foi precisamente o contrário: não é o tempo, nem o passar das horas, a não ser na medida em que o passar do tempo pode dar espaço a uma mudança das pessoas envolvidas naquela relaçãom, que venha a motivar o desinteresse/desencantamento que motive a tal mudança de atitude que permite a morte lenta da relação.

06 outubro, 2006 15:19  
Blogger Uma vida qualquer retalha...

Bem digo que o mundo não me entende! Eu percebi o que se defendia, só pretendi com o excerto clarificar, que até para uma ignorante na matéria, essa é uma falsa questão utilizada vezes sem contas.

06 outubro, 2006 15:59  
Blogger Cravo a Canela retalha...

Reservo-me o direito de uma resposta/opinião com mais tempo e mais horas dormidas.

06 outubro, 2006 17:53  
Blogger Ana retalha...

ah, sim, claro que é das desculpas mais usadas, acho que está no top, talvez esteja para o lado masculino como a dor de cabeça para as mulheres... mas toda a gente já percebeu que, tirando raríssimas excepções, as dores de cabeça são a «tanga» mais antiga do mundo, certo?
Assim é também com o «foi o tempo, a rotina...» enfim... espero que o tempo tenha, sim, a vantagem de fazer com que cada vez esta guerra de sexos seja mais um diálogo do que um combate, propriamente dito e aprendamos a falar uns com os outros, ainda que nos seja muito difícil compreender o sexo oposto (felizmente existem pessoas que, como tu, são clarividentes e ajudam nessa árdua tarefa :-))

06 outubro, 2006 17:59  

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